Como destruir o espírito Natalino

É incrivelmente assustador como percebemos que as pessoas encaram o Natal como uma véspera de consumo!!! E só de consumo! Fica visível a ânsia de todos quererem comprar, comer e beber pelas ruas como ávidos consumidores, deixando claro que fazer bagunça em nome do Papai Noel é muito mais importante do que celebrar, ou ao menos, lembrar do Nascimento de Jesus.

Indo ao shopping center nesse sábado para ver apenas um filme no cinema, prestei bastante atenção em todos os detalhes desse povão massificado pelos Jingle Bells e pelos anúncios das Casas Bahia. Comecei reparando que é nessa véspera de ano, que as classes sociais conseguem se "misturar" com mais frequência pelos corredores dos shoppings e até dentro de algumas lojas chiques e caras... mas eles não se juntam fraternalmente - que isso fique claro -, são apenas unidos pela idolatração ao consumo. Parece que o pobre espera receber seu milagroso e tão esperado Décimo Terceiro Salário para ir à farra e meter o pé na jaca, entrando naquelas lojas pomposas e metidas que só os riquinhos adoravam sentir o cheiro, e lá dentro, todos viram aliados das compras! Sorrisos falsos e marotos em nome da gastagem de grana. Dentes perfeitos e branqueados por ótimos dentistas se mesclam aos dentes mais tortos e com placas de metal diante de roupas e produtos com cifrões ostentosos. O "espírito natalino" os uniu.

Outra coisa que me deixa intrigado e um tanto pensativo, é ver como criancinhas de colo e carrinhos de bebê surgem de todos os lados no mês de dezembro... parece um ataque maciço de choros e chocalhos por toda a parte, enquanto os pais desfilam pelos corredores passando com as rodinhas dos carrinhos por cima dos pés de toda aquela gente! Mas a pergunta que fica é: por que e pra quê levar bebezinhos tão pequenos para dentro de um Shopping Center lotado? Para ver o Papai Noel? Podia até ser, mas notamos que os pais deixam seus pimpolhos "estacionados" dentro dos carrinhos com suas mamadeiras nas portas dos melhores restaurantes e das melhores lanchonetes, enquanto forram o estômago e entornam seus drinques. O "espírito natalino" faz os pais exibirem seus bebês na multidão.

Mais uma coisa estranha são as músicas de Natal... parece finalmente que conseguimos importar todos os jingles estadunidenses enquanto não cantamos mais nenhuma de nossas canções natalinas. Ouvi em quase todas as lojas e butiques que passei pela frente, tocar "The Christmas Song", "Jingle Bell Rock", "Let it Snow, Let it Snow", "Have Yourself a Merry Christmas", "Santa Claus Is Coming To Town", e se tocar "Noite Feliz", pode ter certeza que será na versão em inglês! O "espírito natalino" nos torna mais nova-iorquinos.

Os cinemas, então, completamente abarrotados de gente! E pior: pessoas que não estão nem aí pra ver filmes. Sabe aquela coisa de última hora? Decisões de último instante? O casal se encontra para ir naquele restaurante, mas notam que não tem mais lugares e diz: "Ah, vamos então ao cinema?"; os amigos se encontram para ir no Boliche, mas vê que está lotado e falam: "Que tal vermos algum filme lá no cinema?"; as amigas querendo bater papo na Praça de Alimentação percebem que a mesma está completamente cheia e sugerem: "Vamos ver um filminho no cinema?". Ou seja: o mês de dezembro, curiosamente, é a época onde os cinemas estão mais cheios de gente que não é cinéfila! O "espírito natalino" transborda cultura.

E pra finalizar essa saga destruidora do Natal, vemos aqueles bandos de homens mal humorados que têm de sair com a mulher e a sogra juntas, rodeado dos filhos da irmã da esposa - que deixou pra eles tomarem conta enquanto ela foi fazer umas comprinhas! (ora essa, e o que mais ela iria fazer num shopping?) - tendo que ouvir a sogra dando palpite em tudo e criticando porquê as roupas estão caras, porquê as roupas não estão tendo mais tanta variedade, porquê não fazem mais calças bonitas, porquê as roupas parecem ter hoje as mesmas cores, porquê as roupas estão numa moda estranha, porquê as roupas parecem ter diminuído de número (a sogra jamais se verá GORDA!), enfim, toda essa verborragia incessante da sogra enquanto a esposa ri de tudo que a mãezinha fala, enquanto ele vai sendo isolado, cada vez mais, por elas no meio dos pirralhos bagunceiros da cunhada. Pra piorar, e demonstrar que eles estão putos com aquilo tudo, esbarram na gente com prazer, dão ombradas violentas sem pedir desculpa, pisam no nosso pé com gosto e se reclamarmos, vão nos mandar praquele lugar que Papai Noel ensina as crianças a não irem.

Resumindo: o "espírito natalino" pode ser tudo hoje, menos amor, solidariedade, união e celebração ao nascimento de Jesus. Prova disso é: quem atualmente ainda monta presépios??? Só se for aqueles nossos tios mais velhinhos, rs.

* Marcel Camp procurou evitar falar dos Papais Noéis de Shopping, pois compreende que eles são apenas vítimas de uma temporada sacrificante de trabalho, onde além de se vestirem com roupas pesadas e desconfortantes, ainda precisam aturar crianças que abrem o berreiro no seu colo, pivetes que socam sua barriga, pirralhos que chutam o seu saco (não o de brinquedo!) e testemunhar os pais ignorando aquilo tudo para tirarem fotos dos filhinhos ao lado do Bom Velhinho com a cara suada, debaixo de uma barba com cheiro de amônia.